Amor no ponto de ônibus


Eu vivi por tanto tempo sozinho que nem sabia mais como era a sensação de ser importante para alguém. Às vezes o mundo nos rejeita de uma maneira tão grosseira que a vontade mais forte que sentimos é a de entrar num cativeiro e ficar lá, para sempre, sem o receio dos olhos tortos e sem a necessidade de querer agradar. E eu, como nunca tive essa necessidade e sempre desaprovei a ideia – completamente errada  de ser um personagem perante a sociedade, obviamente jamais consegui cativar os demais que andam em bando e são todos iguais. Na verdade, o meu jeito natural de ser sempre o do contra, acabou não agradando noventa por cento das pessoas que eu conheci ao longo da minha vida. Mas eu não era “o do contra” no sentido negativo das coisas. Eu apenas me recuso a concordar com algo apenas porque 9 pessoas também balançaram a cabeça positivamente. Não é bem assim, não comigo. Se eu não gosto e/ou não apoio algo, eu falo, argumento, digo meus motivos por não concordar sem medo da rejeição dos outros. Isso é ser de verdade e honesto consigo mesmo. E por sempre ser o-cara-que-não-concorda-com-quase-tudo, é fato que a minha vida amorosa sempre foi um tremendo fracasso.

Mas aí, de repente, numa sexta-feira de Setembro, eis que me surge a ideia sagaz de perguntar as horas a uma bela moça que sentara ao meu lado no ponto de ônibus. Confesso que eu sabia exatamente quanto os ponteiros marcavam, mas a minha pergunta ocorreu em virtude do seu perfume fortemente agradável que me fez analisa-la calmamente de canto de olho e reparar nos seus lindos cabelos, nas mãos pequeninas e delicadas que digitavam num desses smartphones de última geração e, principalmente, na sua impaciência por não conseguir, aparentemente, resolver algum problema que o mesmo apresentava.

Após receber a resposta do horário  que eu já sabia –, me atrevi a soltar um “Tá difícil aí, hein?”. É claro que eu já havia me sentido atraído por ela, assim como também é claro que ela não me daria à mínima bola. Com certeza não daria. As outras com quem tentei ser “simpático” e forçar intimidade não me deram, por que ela daria?

 Muito. Estou quase desistindo e jogando esse celular no chão – disse ela.

 Opa! Opa! Opa! A moça me respondeu humildemente e não usou tom de ironia na voz querendo se desfazer de mim. Pelo contrário, sua resposta saiu como forma de desabafo e um sutil pedido de socorro. Automaticamente sorri sem descolar os lábios e perguntei qual era o seu problema. É claro que fiz a pergunta sem parecer um cafajeste com tom de segundas intenções,  embora essa fosse a real intenção –.

Ela então chegou mais para perto, virou o seu celular para a minha direção e me explicou o que estava tentando fazer há quase uma hora. Ao tomar conhecimento do “problema”, gargalhei em pensamentos. Era uma coisa tão pequena, tão boba e tão fácil que eu me aproveitei da situação e resolvi complicar um pouco mais na resolução para ganhar tempo ao seu lado e me deliciar ouvindo a sua doce voz de menina.

Após finalmente eu terminar de resolver o seu “grande problema”, ela me deu um lindo sorriso de satisfação mostrando os seus dentes perfeitamente bem alinhados e soltou um “Muito obrigada, você salvou o meu dia!”. – E você melhorou completamente o meu – Pensei. Mas respondi apenas que não havia sido nada. Depois dessa quebra de gelo, conversamos sobre coisas aleatórias e sem fundamentos para ver o tempo passar e, após reclamarmos da demora recordista do ônibus naquele dia, ele enfim passou. Estava tão cheio que não havia mais espaço nem para colocar um pé.

 Ferrou! É hoje que eu perco aula na facul – desabafei.

 Assino embaixo dessa tragédia matutina. Na verdade, eu estava mesmo sem clima para estudar hoje. Talvez isso seja uma resposta ou um aviso do destino para eu não ir mesmo – rebateu ela.

 E eu, muito astuto, aproveitei a deixa e disparei:

 Ou talvez seja uma sugestão dele para que você tome café comigo ali na padaria da esquina. Eu pago! Aceita? 

(Obrigado Deus pela coragem. Obrigado dono da padaria da esquina, se ela não existisse esse convite jamais teria acontecido. Obrigado pessoas que lotaram aquele ônibus.).

 Juro que eu estava esperando todos os tipos de desculpas possíveis como rejeição, mas eis que ganho de presente um “Sim”. O que me surpreendeu de novo. Mal eu sabia que aquele tímido “Sim” seria a porta aberta para inúmeros outros sins vindo dela. Desde o sim para ir ao cinema comigo ao sim para aceitar o meu pedido de namoro.

E foi assim, em uma manhã comum que eu conheci a pessoa que me aceitou como eu sou, que me olhou com olhos virgens de rótulos, que me fez sentir-me importante outra vez e me mostrou que o amor está solto por aí. Para todos. Basta as pessoas darem uma chance a serem mais humildes, a não julgarem pela casca, a serem mais receptivas, a se permitirem dizer mais SINS.

 Diga sim! Com força. Diga, SIM! O amor é um enorme SIM.

E com o passar do tempo ao seu lado, eu aprendi que amar é quebrar os cadeados da solidão. É abandonar a hipocrisia e sorrir para o mundo com o brilho nos olhos que só um amante tem. É proteger o seu parceiro (a) com a mesma necessidade de querer ser protegido. É ser forte. Ser muito. Ser grande. Amar é não ter medo de não ser o bastante para agradar o mundo, mas sim ser o suficiente para agradar quem nos retém felicidade. E por fim, amar é ser você do jeito que só você consegue ser. Porque o amor é como a infância, doce, puro e inocente. A gente é quem complica tudo e o torna ruim quando não sabemos senti-lo e compartilha-lo.


5 comentários:

  1. Tô cada vez mais encantada com os seus textos!!! Lindo demais.

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  2. muito sinceramente esse texto esta lindooo

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  3. Um toque de sensibilidade e emoção sem igual...
    Simplesmente PERFEITO!
    Você consegue trazer sentimentos a muito esquecidos e abandonados a uma realidade simples e descomplicada.
    Lindo demais!

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  4. sou apaixonada pelos seus textos *---* e aliás tu é muito parecido com um amigo rs' bjos

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