Passou como um vento

Sentir o teu cheiro e não lembrar mais. Receber notícias tuas, e não me importar mais. Ver outros braços em volta da tua cintura e não derramar mais ciúmes. Encontrar-te no caminho contrário ao meu na calçada e não sentir-me mais agoniado. Pois é querida, passou. 

Mas querida, foi difícil viu? Mais complicado que explicação de seno, cosseno e tangente. Juro que houve dias em que pensei em te ligar, da mesma forma que fiz no dia seguinte do nosso término. Mas ao lembrar-me de cada palavra dita por você naquela ligação, via a minha vontade ir embora antes mesmo de completar a discagem. 

A necessidade de saber como estava a sua vida com a minha ausência era enorme. Lembro-me de ter ligado algumas poucas vezes para a sua melhor amiga perguntado-a como você estava, o que provavelmente ela deve ter te contado. Para o meu azar e sorte, você nunca foi chegada a redes sociais. E hoje vejo que isso foi bom, porque quanto mais as pessoas sofrem, mais elas querem ler, ouvir e descobrir coisas que só fazem aumentar o grau da sua tristeza. É como um sadomasoquismo sentimental.

E você sabe, eu sempre fui um homem de papo envolvente e conquistador de várias mulheres, foi difícil aceitar a sentença dizendo que eu estava em dias cinza. Porque o sofrimento é um sentimento que aperta o coração e incha os olhos. E eu era machista cem por cento a ponto de seguir a regra de que o homem não chora por mulher nenhuma. Mas aí eu chorei. E foi derramando água dos meus olhos que eu percebi que nem sempre a minha certeza está certa. 

Linda como uma princesa e cheirosa como uma flor. Flor vermelha recheada de espinhos. Imaginei que um dia dividiríamos o mesmo teto, mas a imaginação foi fértil demais. O brilho dos teus olhos parecia ser hipnose, mas era ilusão. Eu achei que era amor, mas foi só uma forte paixão. Eu pensei que era você, mas não era não.

Mergulhei no mar do teu beijo sem boias salva-vidas, e logo tive que aprender a nadar contra a correnteza. Afoguei-me algumas vezes, é normal. Mas eu consegui, viu? Demorou a sarar a ferida. Mas não é que o tempo passe devagar, é que o tempo, ele não tem pressa. E foi no tempo do tempo que eu percebi que já era tempo de deixar o tempo perdido para trás. E foi lá atrás que você ficou. Como os cadernos escolares substituídos por outros. Como a feliz e amada infância. Como os livros que se acumulam na minha estante. Porque a paixão é como um vento, uns fracos e outros fortes. Mas a regra é uma só: Vem, te causa uma sensação boa, mas passa.