De malas cheias

Estou voltando. Andando em sentido contrário. Regredindo às minhas raízes e desapontado com os meus sonhos fracassados. Você me avisou. Eu sei. Mas eu sou teimoso, você sabe. Eu poderia ter pensado uma vez mais. Ou duas, ou três, ou inúmeras vezes mais antes de ter escolhido transformar você em passado. Eu poderia ter buscado a sabedoria para enxergar o erro que estava na minha frente. Mas eu resolvi arriscar. Eu quis pagar para ver. Afinal, a vida é isso. É correr riscos. É andar no escuro apenas com a luz do nosso objetivo. É caminhar na chuva descalço, sem medo de ser atingido por um raio. É ser o raio. O raio do nosso próprio alvo. Mas eu fiz questão de ser apenas um simples relâmpago. Desses que piscam, assustam com o seu grito e não fazem nada.

Eu conheci novas pessoas. Eu beijei outras bocas. Eu deitei em outras camas. Eu abracei outros corpos. Eu busquei felicidade. Observei que o ser humano é carente de humildade na alma e simplicidade no espírito. Aprendi que confiança não pode ser doada a qualquer rosto simpático que te deseja bom dia. E dentre todos os meus conflitos e frustrações vividas até então, concluí que o mundo é bem mais difícil e complicado do que eu imaginava. 

Das pessoas que eu conheci, todas foram sem tempero. Muitas serviram apenas para fazer lembrança. E poucas, pouquíssimas valeram à pena. Das bocas que eu beijei, todas tinham gosto de ferrugem. Nem se comparam aos doces e delicados beijos que troquei contigo. Das camas que eu deitei, os lençóis eram de tecido barato. Tão sem valor quanto os sexos que eu fiz sobre eles. Dos corpos que eu abracei, poucos tiveram o aperto parecido com o teu. Mas nenhum conseguiu superar o teu calor. E da felicidade que eu busquei, só encontrei mais espaços vazios.

Andei. Conheci. Testemunhei. Sorri. Chorei. Vivi e cansei. Cansei de insistir numa realidade que não é minha. Cansei de tentar ser o que a vida não quer que eu seja. Estou com as malas cheias. Cheias de sentimentos dobrados que me fazem mal. Preciso esvaziar. Então eu desisto. Desisto de continuar trocando o certo pelo duvidoso. Estou voltando. Voltando na esperança de ter os teus braços abertos à minha espera. To com saudade de sentir a pulsação do teu peito. Do calor da tua respiração forte. E do sorriso que já fez e se desfez inúmeras vezes na minha cabeça antes de eu fechar os olhos para dormir.

Coloca-me no eixo de novo. Firma o meu pé novamente no chão. Lubrifica os meus motores que pararam de trabalhar já há algum tempo. Diz-me não. Bate-me. Fala que me odeia. Maltrata-me. Eu nem ligo. Eu só quero que seja você. Porque é só com você que eu me sinto em paz. Você é o meu carro-chefe. Então me espera aí amor. Espera que eu to voltando. O ônibus tá indo devagar, mas eu to chegando.